CRÓNICA DE UM FÃ DE GUNS (2)
A partir daquele momento, a minha paixão por «Appetite» cresceu e depressa me levou a comprar o vinil de «Lies». Ouvi ambos até à exaustão e, à época, começava também a ceder às baladas, tidas até aí, pela minha pose “metaleira”, como peças secundárias. As hormonas que o expliquem provavelmente, mas «Sweet Child O´Mine» e Patience» passaram a figurar na minha lista de temas mais ouvidos e a embalar os momentos de descoberta e de despertar para uma nova vida.
Ainda hoje, quando ouço «Appetite» dou-me como surpreendido. O velho lado A da versão em vinil, de «Welcome To The Jungle» a «Paradise City», continua a ser qualquer coisa de notável. Pela produção de Mike Clink, pelos solos violentos e simultaneamente melódicos de uma clássica Les Paul nas mãos de Slash, pela rudeza punk do toque de palheta de Duff no baixo, pela guitarra ritmo seca e carente de preciosíssimos de Izzy Stradlin e, obviamente, pelo desespero e violência urbana lançada em cada palavra cantada por Axl Rose. Até o limitado Steven Adler na bateria brilha! – ele que seria o primeiro a abandonar a banda, consta que, por estar cada vez mais mergulhado no poço fundo da heroína. De todo aquele álbum, só «Think About You» ou «Anything Goes» parecem estar um pouco fora do contexto. As grandes canções estão todas lá, e longe de mim imaginar que, em versão mais soft (felizmente!), «Mr. Brownstone» assentaria como uma luva enquanto banda sonora de um determinado período da minha vida.
A loucura Guns n´Roses estava prestes a dominar o mundo. «Appetite» fora um dos álbuns mais vendidos nos Estados Unidos em 1988 (só batido nos tops pelo trabalho de uma boys band chamada New Kids On The Block), porém, na Europa, pouco mais que a família dos «metaleiros» ouvira falar da banda de Slash e Axl Rose. «Lies» (sobretudo devido a «Patience») e uma muito divulgada actuação dos Guns no Rock In Rio (de Janeiro) em 1990 (donde saiu a versão de cd single do «Knockin´On Heavens Door») foram abrindo caminho ao fenómeno planetário que recuperaria o rock (não FM) para os tops, secundarizaria a decadente pop dos anos 80 e tornaria bandas outrora vistas como confinadas a públicos muito específicos em autenticas máquinas de vender discos. Os «Illusion» marcavam essa grandiosa aposta da indústria discográfica: pela primeira vez na história da música, uma banda lançava simultaneamente dois álbuns duplos. Foi, se não me engano, em Setembro de 1991. Os Guns lançavam-se aos palcos do mundo, rodeados de mitos, de escândalos e de lendas. Tudo sob os auspícios de uma máquina promocional de eficácia extrema que os tornava os pontas de lança de um rock´n´roll renascido para a vida.
Mas, para os fãs mais antigos da banda, a primeira baixa de vulto acontecia: Izzy Stradlin, após o lançamento dos «Illusion» abandonava a banda e abraçava uma carreira a solo. Nunca se soube ao certo a verdade por detrás das estórias contadas, mas consta que, por achar que os Guns já eram demasiado grandes para ele, Izzy decidiu abandonar o projecto. A outra versão estórica garante que o ambiente entre os músicos era absolutamente destrutivo, sobretudo as relações mantidas entre a banda e a «vedeta» Axl Rose. O certo é que sem Izzy, os Guns deixaram de fazer novos temas, ou não fosse ele responsável por mais de metade das canções da banda. A Matt Sorum, ex-Cult, que substituira Adler durante as gravações dos «Illusion», juntava-se um novo membro para a digressão mundial, o guitarrista Gilby Clarke. Sem qualquer pista para o prevermos na euforia do fenómeno, os Guns n´Roses no auge eram já uma banda com os dias contados!