PROIBIDO FUMAR
Aqui se recupera o texto de um agora membro da «gazeta», disponível também no blog Marados da Tasca. Trata-se da reedição de uma crónica deste destacado repórter, em Madrid, a qual nos parece tão actual, dado os indícios da adopção de medidas restritivas, em Portugal, ao consumo de tabaco em locais públicos.
Camaradas e amigos,É com uma enorme tristeza que vos digo que abriu a caça ao tabagista nestas terras de Espanha. Já todos tínhamos ouvido que os tipos estavam a apertar o cerco ao bom do vício, mas isto começa a ultrapassar as medidas e já por duas ou três vezes estive para me meter no expresso e voltar para o nosso luso-paraíso atlântico. Acabado de chegar à capital dos espanhóis, após umas 15 horas de viagem nesse expresso manhoso que me orientaram em Lisboa, estava desesperado por uma bela cigarrada.
Era noite, fazia um frio do caraças; saio da carripana com a peida quadrada, dou o último trago na garrafa de escocês do Lidle e saco do maço de ventil... Levo a mão ao bolso e quando surge o isqueiro incandescente a tocar a ponta do cigarro ouço um apito ensurdecedor. Um agente da Guardia Civil, armado em chico esperto, informa-me que, se der um bafo, tem de me autuar porque não se pode fumar em instalações públicas, como terminais de camionagem ao ar livre. Raios o partam se não o mandava bugiar fosse eu um jornalista bem pago!
Acatei a ordem porque me bastava dar meia dúzia de passos para estar na rua, sítio de liberdade, local onde podia fumar tranquilamente uma valente cigarrada. E assim foi, mas, imaginem vocês, as gentes locais que passavam por mim fitavam-me com aquele olhar de desconfiança, como se estivessem perante um perigoso criminoso.
O hotel, a quase uma hora do Santiago Barnabéu (obrigadinho, ó Marados!), fica num bairro de má fama mas terrivelmente policiado. Segundo dizem, desde aquela barbaridade na estação de Atocha, a coisa roça um policiamento tipo franquista (mas longe de mim acreditar que aqueles tipos armados e fardados andassem à caça de fumadores que ousassem dar umas passas em recintos públicos fechados!). O certo é que, mal chego ao pardieiro, ou seja, ao “hostal”, o sacana do recepcionista informa-me que não é permitido fumar em qualquer dos espaços do local, incluindo os quartos. Acato a ordem com toda aquela mordacidade portuga do tipo «já te conto uma história, ó espanhuel!». Afinal, com quem julgava aquele sacanita madrileno estar a falar? Impor ordens a um profissional da comunicação português?! - «isso mesmo, ó Manuel, eu sou um colega da Maria João Ruela, do Albarran antes de ser sócio de agentes da CIA, do tipo das orelhas grandes que apresenta as notícias em Portugal. E de tantos e tantos heróis do jornalismo mundial made in Portugal!»Estive para lhe responder, contando-lhe as verídicas histórias que vivi por um mundo inteiro de proibições e repressão... Eu fumei no aeroporto de Amesterdão, que ostenta, orgulhosamente, o estatuto de «non smoking airport» ! Eu pratiquei sodomia com uma loira fantástica num hotel do Alabama, estado americano onde tais práticas podem dar prisão perpétua! Eu fumei charros no intervalo de um julgamento, em plena Boa Hora, onde me arrolaram como testemunha de um caso de atropelamento e fuga de canídeo... – o tanas, se a primeira coisa a fazer quando fechasse a porta do quarto não fosse fumar um belo de um ventil deitado na caminha. E comentei com os meus botões, «Para ti fascista espanhol, vou fumar o maço todo no quarto e espalhar-te as beatas em redor da recepção!»
Lar doce lar! O quarto era do piorio mas, mal senti a porta fechada, zás! Toca de matar o vício. Eu deitado na cama (uma tarimba, diga-se), cigarro a arder, o fumo a envolver-me... Parecia o nirvana! – Então não é que me batem à porta.Com bons modos, o gerente do hotel explicou-me que não podia fumar no quarto, mas podia sair à rua e saciar livremente o meu vício. Fiquei a olhar para ele uns segundos e depois disparei um chavão do castrelhano: «non comprendo». O tipo ficou rubro e começou a gesticular incessantemente. Não resisti e fechei-lhe a porta na cara, saltei para cima da cama e acendi um outro cigarro. Minutos depois, voltei a ouvir um bater na porta. De novo o gerente, mas agora acompanhado por dois polícias. Fumei mesmo o último cigarro na rua, defronte do hotel, depois de ter pago uma coima de 250 euros antes que me suspendessem a reserva do quarto.
Após um dia inteiro a cumprir a lei espanhola, comecei a salivar por uns copos e umas valentes cigarradas. Dada a inflexibilidade legal da coisa, ocorreu-me que só um local poderia valer-me tal conjugação de prazeres: um bar de strip!Superando o epicentro da «movida» madrilena, entrei num espaço mais ou menos recôndito mas de aspecto limpo e agradável. E bem servido de funcionárias, esclareça-se. Sentei-me numa mesa defronte da passerelle, pousei o maço de cigarros e congratulei-me com a minha astúcia – só um recinto fechado como um bar destes poderia permitir-me fumar e beber; parece-vos possível que as funcionárias não tentem a abordagem pelo engastar de uma bebida e de um cigarro? Num bar destes não me podem negar o direito a fumar; no fundo, o cigarro é interprete destacado neste tipo de filme!
Um funcionário aproximou-se e assentou o meu pedido, mas quando pedi um cinzeiro apontou-me as sinaléticas: Proibido Fumar. «Fascista! Não me podes negar os prazeres», pensei, já num desespero imenso. De repente, apareceu uma bela bailarina de peitos semi-descobertos que, num castelhano arrastado e cheio daquele sotaque frio do leste, se sentou a meu lado. Blá-blá-blá, e ofereço-lhe um cigarro... «Yo lo quéria...» - Não ouvi mais nada, meti-lhe um cigarro na boca ao mesmo tempo que acendi o meu. Só me recordo de dar um valente trago no balão de uisque e deixar que o fumo circulasse dentro de mim, antes de a ver cuspir o cigarro apagado e chegar um Guardia Civil à paisana para me autuar.
Por tudo o que vos conto, não aguento mais. Estou sem dinheiro, a pista Ronaldo é um valente delírio dos Marados da Tasca, e cada vez que um polícia me apanha a dar umas passas num sítio fechado (mesmo que num bar de putas) multa-me e manda-me ao Palácio da Moncloa fumar com o Zapatero.Que saudades tenho eu de Portugal, nossa terra maravilhosa!
Repórter X, Madrid, 22 de Fevereiro do ano da desgraça de 2006
Repórter X, Madrid, 22 de Fevereiro do ano da desgraça de 2006
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